Chade: 6 de maio


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Tudo indica que as eleições presidenciais e legislativas de maio no Chade serão um exercício altamente orquestrado para garantir a permanência do General Mahamat Déby no poder. Déby assumiu o controlo do governo do Chade através de um golpe militar em abril de 2021, na sequência da morte do seu pai, o Presidente Idriss Déby, que tinha tomado o poder num golpe de Estado 30 anos antes.

Como resultado dos meios inconsitucionais que lhe permitiram assumir o poder, Mahamat Déby tem-se debatido com um persistente défice de legitimidade. Ao assumir o poder executivo, prometeu uma transição para eleições democráticas no prazo de 18 meses. Em vez de honrar esse compromisso, organizou um Diálogo Nacional que foi fortemente controlado pelos seus lealistas. O Diálogo produziu o resultado previsível de que a transição deveria ser prolongada por mais dois anos e que os líderes da junta seriam elegíveis para integrarem o governo civil subsequente, algo que tinham inicialmente renunciado.

O Chade nunca viveu uma transição eleitoral pacífica do poder, apesar das exigências persistentes e generalizadas dos chadianos no sentido da adoção de normas democráticas.

Em 20 de outubro de 2022, os partidos da oposição, os líderes da sociedade civil e os cidadãos do Chade, empenhados na instauração da democracia e no regresso ao regime constitucional, organizaram protestos para assinalar o fim do período de 18 meses da junta. As forças armadas do Chade reprimiram violentamente os manifestantes desarmados, causando cerca de 300 mortos e centenas de detidos.

Em dezembro de 2023, dando continuidade com ao processo de transição e ignorando um boicote da oposição, a junta promoveu um referendo que lhe permitiu adoptar u uma nova Constituição, aprovar a participação de membros da junta num governo eleito e fixar novembro de 2024 como data das eleições. Esta medida seguiu-se a uma amnistia geral para todos os indivíduos responsáveis pela violência contra os manifestantes em outubro de 2022. Alguns parceiros ocidentais têm dado uma grande margem de manobra ao Chade no que diz respeito à implementação de reformas democráticas genuínas, dado o papel estabilizador que o Chade desempenha no Sahel. No entanto, os principais atores africanos estão preocupados com os efeitos da instabilidade no Chade nos seus seis vizinhos. A título de exemplo, a Comunidade Económica dos Estados da África Central, da qual o Chade é membro, tem manifestado poucas expectativas de que o Chade respeite as normas democráticas.

Uma reviravolta no ano eleitoral foi a nomeação de um dos principais líderes da oposição, Succès Masra, como novo primeiro-ministro da Junta. Líder popular do partido reformista Les Transformateurs, que foi um dos principais organizadores dos protestos de outubro de 2022, Masra fugiu do Chade após a violenta repressão dos militares. Muitos membros do seu movimento foram mortos ou presos. Posteriormente, a Junta emitiu um mandado de captura internacional contra Masra. No âmbito de um acordo negociado para permitir o seu regresso do exílio, o mandado foi revogado e 72 membros do partido da oposição detidos foram libertados.

A morte a tiro do político da oposição Yaya Dillo Djérou e de dezenas de apoiantes pelas forças de segurança, a 28 de fevereiro, constituiu um sinal claro para todos os intervenientes políticos no Chade de que Déby não irá tolerar qualquer qualquer tipo de ameaça ao seu poder. Dillo, primo de Déby, era o líder do “Partido Socialista Sem Fronteiras”, que atraiu o apoio de antigos oficiais militares de renome. Dillo era também líder influente no grupo étnico Zaghawa de Déby, que tem o seu reduto na fronteira entre o Chade e o Sudão. Dillo opôs-se fortemente ao apoio tácito do Chade às Forças de Apoio Rápido (RSF), na guerra civil do Sudão.

Women queue to cast their votes in N'Djamena, Chad.

Mulheres fazem fila para votar em N’Djamena, no Chade. (Foto: AFP)

As alterações constitucionais arbitrárias, os atrasos eleitorais prolongados, assassinatos, e a cooptação de figuras importantes da oposição, eram parte integrante do comportamento autocrático de Idriss Déby. Esta tática permitiu ao velho Déby manter a presidência durante seis mandatos, apesar de a Constituição do Chade prever um limite de dois mandatos.

Esta abordagem maleável em relação à Constituição permitiu à família Déby e aos militares, que funcionam como suporte poder, consagrar um sistema de sucessão hereditária, de forma a permanecerem no poder indefinidamente.

Esta disposição é uma das principais razões pelas quais o Chade nunca viveu uma transição eleitoral pacífica do poder, apesar das exigências persistentes e generalizadas de normas democráticas por parte dos chadianos. Esta situação contribuiu para a instabilidade persistente que o Chade tem enfrentado ao longo das décadas, com múltiplas rebeliões armadas, assassinatos políticos, crises económicas e disparidades crescentes num país de 17 milhões de habitantes, rico em petróleo, que ocupa o último lugar da classificação do Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas.

Mahamat Déby tem-se debatido com um persistente défice de legitimidade.

Também em 2024, o Chade terá de enfrentar a intensificação da instabilidade regional e das tensões entre fronteiras. O primeiro deles é o conflito fragmentado no Sudão. Os combates entre as Forças Armadas sudaneses e as milícias rivais RSF, lideradas por Mohamed “Hemedti” Hamdan Dagalo, que eclodiram em abril de 2023, provocaram a deslocação de mais de 700.000 refugiados sudaneses para o leste do Chade. (Isto, a somar aos 600.000 que anteriormente o Chade já recebera.) Em resposta, as forças armadas do Chade forneceram escoltas armadas a grupos humanitários que prestam assistência a estes refugiados.

Estes movimentos populacionais são sensíveis, uma vez que o Chade e o Sudão têm um historial de apoio a movimentos rebeldes nos respetivos territórios o, normalmente centrados na região de Darfur, no oeste do Sudão, que tem sido o foco dos ataques das RSF contra civis, incluindo os da tribo Zaghawa, à qual Déby pertence. Os líderes zaghawa teem exercido pressão sobre Déby para que apoie os grupos rebeldes do Darfur que resistem à RSF. Em vez disso, relatórioss indicam que Déby está a permitir que os Emirados Árabes Unidos utilizem o Chade como base de apoio para abastecer as RSF. A RSF beneficia igualmente do apoio russo proveniente da Líbia e da República Centro-Africana. Moscovo está simultaneamente ligado ao patrocínio de grupos rebeldes armados no sul do Chade.

Entre a influência russa e os governos militares no Sahel ocidental e no Sudão, o Chade poderá ser arrastado para uma dinâmica geopolítica regional e internacional que agravará ainda mais a sua instabilidade em 2024.