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A Guiné-Bissau enfrenta um ambiente eleitoral turbulento em 2024. País s costeiro da África Ocidental, com 2 milhões de habitantes, tem sido palco de sequentes crises.
A Guiné-Bissau sofreu quatro golpes de Estado e mais de uma dúzia de tentativas de golpes de Estado, ao longo de 23 anos a independência de Portugal em 1973. O Presidente Úmaro Sissoco Embaló dissolveu o Parlamento duas vezes em dois anos (incluindo em dezembro de 2023), alegando tentativas de golpe de Estado, o que contribuiu para a paralisia do Governo.
A história mais importante na Guiné-Bissau em 2024 será sobre como construir e manter estabilidade governative e proteger as instituições de abuso de poder.
Embora os principais partidos políticos não tenham apresentado oficialmente os seus candidatos, as eleições de 2024, podem, eventualmente, representar uma reviravolta face às eleições 2019, em que o Presidente Embaló obteve 53,5% dos votos contra 46,5% em Domingos Simões Pereira.
A instabilidade da Guiné-Bissau ocorre em diferentes níveis.
No centro da disfunção da governança estão diferentes visões quanto ao papel do executivo no sistema semi-presidencial da Guiné-Bissau. Neste sistema, o presidente é o chefe de Estado e o primeiro-ministro é o chefe do governo. O primeiro ministro é eleito pelo parlamento e escolhe os ministros para integarem o governo. Este sistema vigora desde d aprovação da Constituição de 1993, de modo a reforçar a separação de poderes entre o poder executivo, o parlamento e o poder judicial. Esta foi uma resposta ao regime de 19 anos do Presidente João Bernardo Vieira, que concentrou o poder no executivo, facilitando abusos de poder e impunidade.
O Presidente do Parlamento, Pereira, e a sua Plataforma Aliança Inclusiva-Terra Ranka (PAI-TR), uma coligação de pequenos partidos em parceria com o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), propuseram reformas constitucionais para clarificar os poderes entre o Presidente e o Primeiro-Ministro. Embaló, um produto do antigo sistema presidencial centrado no Estado e próximo dos militares, esperava, pelo contrário, assegurar uma maioria parlamentar nas eleições legislativas de junho de 2023 para por em prática um regime presidencial, mediante a adoção de uma nova constituiçao. O PAI-TR saiu vitorioso com uma maioria de 54-48 no Parlamento. A coligação conta ainda com o apoio de mais 12 deputados de partidos alinhados.
Embaló reagiu a este revés criando um gabinete-sombra de “conselheiros presidenciais”, composto por antigos ministros e funcionários da segurança com ligações estreitas às forças armadas e à polícia. A dissolução do parlamento e a demissão do primeiro-ministro, Geraldo Martins, em dezembro de 2023, é vista como uma tentativa para garantir o afastameno do poder legislativo e, simultaneamente, exercer o poder executivo como presidente.A autoridade governamental na Guiné-Bissau surge em muitas das situações, associada a interesses sobre determinadas atividades, de cariz ilícito e ilegal, nomeadamente o tráfico de estupefacientes, o abate ilegal de árvores, o controlo de contratos públicos e o desvio de receitas fiscais. A Guiné-Bissau é desde há muito considerada como o principal centro de tráfico de cocaína na África Ocidental para os cartéis de droga latino-americanos. Há indicações de que o contrabando de estupefacientes aumentou durante o mandato de Embaló, tendo a última grande apreensão de droga ocorrido em 2019. A Guiné-Bissau é considerada como um dos países mais corruptos do mundo pelo Índice de Percepção da Corrupção e da Transparência Internacional.
Este legado de clientelismo tem estado profundamente ligado aos serviços de segurança. Na história da Guiné Bissau, as forças armadas e a polícia têm sido utilizadas pelos líderes políticos para proteger os seus interesses políticos. Esta politização, por sua vez, incentivou os chefes militares a utilizarem as suas posições oficiais para defenderem os seus interesses financeiros e, por vezes, a montarem golpes de Estado contra os seus chefes políticos. Este é outro fator determinante da volatilidade da Guiné-Bissau.
A instabilidade persistente da Guiné-Bissau tem tido um impacto na qualidade de vida dos seus cidadãos, com o país a mostar alguma incapacidade em aconpanharo desenvolvimento do continente em termos de rendimento per capita, taxas de mortalidade e habilitações literárias. A melhoria dos serviços de saúde e educação foi uma parte fundamental da plataforma de campanha vencedora do PAI-TR nas eleições legislativas de 2023 e provavelmente terá também um papel central nas eleições presidenciais de 2024.
A votação de 2024 tem, por conseguinte, implicações significativas não só para as prioridades políticas da Guiné-Bissau, mas também para o seu modelo de governo e para o seu sistema de verificações e controlo.
Apesar do seu longo legado de instabilidade política, a Guiné-Bissau tem também um historial de eleições e alternâncias de poder relativamente competitivas. Este facto deve-se, em parte, à composição profissional da Comissão Nacional de Eleições (CNE). O Secretariado Executivo do CNE é composto por magistrados nomeados pelo Conselho Superior da Magistratura e eleitos por dois terços do Parlamento para um mandato de quatro anos. As dissoluções do Parlamento impedem o preenchimento dos lugares vagos no Secretariado Executivo, dificultando a preparação das eleições.
Os atores da sociedade civil continuam a insistir em reformas que institucionalizem uma maior transparência e supervisão.
A existência de uma sociedade civil resiliente na Guiné-Bissau, tem sido o ingrediente mais importante na tempestuosa vida política do país. Apesar dos numerosos retrocessos, a sociedade civil continua a insistir em reformas que institucionalizem uma maior transparência e supervisão de fundos públicos e de de políticas públicas, capazes de servir os interesses dos cidadãos.
Uma forte participação no processo eleitoral de 2024, será fudamental para futuro da Guiné Bissau.
Ao longo dos anos, a Guiné-Bissau tem igualmente beneficiado do apoio regional e internacional. A Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, liderada pelo Senegal, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, a União Europeia, Portugal, a França e o Fundo Monetário Internacional têm-se empenhado em ajudar a estabilizar a Guiné-Bissau. Entre outras iniciativas, isto implicou o destacamento de operações de paz alargadas, apoio financeiro e a intervenção como negociadores terceiros.
Para além dos resultados eleitorais, o mais importante para a Guiné-Bissau em 2024 será sobre como construir e manter um sistema político estável e a impermeabilidade das instituações face ao autoritarismo e tentaivas de abuso de poder.